segunda-feira, 21 de maio de 2012

A VOZ POÉTICA DO ESCRITOR CIRO JOSÉ TAVARES - BRASILIA/DF

Negro rio que te quero mergulhado
No doce mistério dessa escuridão.
Quando calmo, rio, tenho medo de ti
Pois reconheço ser a menor parte,
Um grão de homem face ao volume d’água,
Átomo de Deus estendido no teu leito.
Nesse desejo de imitar os oceanos
Porque te revoltas contra quem dominas?
Não te basta o gigantismo do ambiente?
A servidão dos incontáveis tributários?
O canto das aves ritmando a correnteza?
A beleza dos verdes que alucinam?
Lendas dos botos e das iaras, construídas
No inacessível fundo da floresta,
Pelas vozes modorrentas dos pajés?
As mágicas poções dos curandeiros?
O nevoeiro vestindo as sumaúmas
Ou parecendo aru cobrindo igarapés?
Sombras de dias e noites amalgamadas?
Auroras suaves espantando curupiras?

Negro rio que te quero sangue do meu sangue.
Devolve aos Andes os ventos que chamaste
Para agitar teu corpo num momento de fúria.
Cumpre teu destino, que é seguir adiante,
Nobre, cristalino, noturno, temerário.

Ciro josé Tavares, in ODE AO RIO NEGRO

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