quarta-feira, 24 de novembro de 2010

A EXPRESSÃO POÉTICA DE DAUFEN BACH

"dos silêncios que coleciono na noite" - Parte 2

(imagem: Kevin Day. Árvore Morta)

XIV
há uma certa magia nas coisas que acontecem ao acaso
o abstrato das emoções se intensifica e se correlata
.....................................................[com a realidade.
as emoções sempre carregam algo de físico,
das vigílias e dos sonhos
que nunca sabemos ser a causa ou a consequência.

sempre o rubor e o sulco das lágrimas
que vivifica e mistura, à face, o doce e o salgado.


XV
quando acordei, na madrugada, o cheiro de jasmim
.................................[invadia as frestas da porta.
nas sensações, algo de prímevo acendeu o desejo,
..........................................................a ternura
.................................................e a esperança...
.......................................algo de antigo e frágil.

desejei levar comigo o jasmineiro para além,
para um país apenas de jasmins,


XVI
"não sei se és a morte. sei que estás em meu peito"
uma agonia branca de dúvidas, esta.
no meu tempo, não no tempo que sonho para o
...........................................................[amanhã,
tampouco o tempo do passado,
no meu tempo de todas as coisas,
uma inquietação.

nos meus poentes vejo os carro de bois descerem a
ladeira e margearem a gruta fincada na rocha.
uma imagem. Nossa Senhora de Lourdes, olha
..............................................[cima da escadaria.
córregos, cachoeira e quietude.
uma paz de sombra e umidade...
os carros de bois, sentenciosos, adentram para
......................................................[a noite.

entorpecido, testemunho que todos os caminhos
estão a um passo. meus pés tremem.

uma rua dura concebe o caminho da alvorada.
preciso aprender a ignorar as conjecturas,
além do agora, tudo é um vasto campo de
..............................[abstração e incertezas.


XVII
contemporâneo. sempre contemporâneo. o amanhã
é outra coisa, uma consequência. o ontem uma causa.
hoje, uma síntese imperfeita. promessas
...................................................&
...........................................milagres.

XVIII
dos favores e dos mistérios concedidos a mim,
nesses caminhos de rios,
nesses deslimites instaurados em corredeiras,
flutuo na intimidade de teu corpo-menina,
com que me acostumei estar sempre em festa.

nos teus dias, outros, quando sorrires e, de
esquecimentos, não mais lembrar,
terei antecipado a amorosa elegia dos
desenganos dissipados no tempo-do-sem amor.

como um anjo obscuro, feito de despedidas,
voltarei de teu olhar,
...........de teu calor
para abraçar o frio e o escuro das madrugadas
..................de julho numa solidão inevitável.

estarás como os "de repentes",
próxima.
sem mim, sem amor.
..................................liberta.


XIX
venho de longe. alazões furiosos balançavam
as crinas e sumiam na penumbra. ruidosos
..................................[cascos, silenciavam.

apenas o sussuro do orvalho na relva,
a louvar a tarde que caiu, fazem-me
..................................................[reconhecido.
andante, peregrino... tento entender esse tempo
........................................ ..[que vive em mim.

não espero. sigo devagar.
quero merecer outra manhã.


XX
as aguas turvas, calmas
afastam-se como se apiedades
do abraço inútil da luz que investiu
e sumiu dentro da noite.

louvam as estrelas festeiras,
no espelho das águas,
o abandono de minhas palavras.

os terraços silenciosos esperam o amanhã
.............................................[que vem.


XXI
meço o tempo nas baforadas do cigarro.

a minha porta, meninos sorridentes falam alto,
parecem nao ter visto o dia, livres como a fumaça.

.................................................invisibilidade.
...................................................imprecisões.

no meu rosto, uma febre de ver acontecer.


XXII
tinha em cada vinco da face um traço maldito,
uma intratável persistência em ser mais do
............................[que aquilo que podia ser.
sua plenitude, pobre, carecia de mais um suícidio...
...................................................[o dos sonhos.


XXIII
a lua, enredou-se rumo ao nascente.
a noite era tão pouca,
tudo era tão pouco,
como a solidão de um cego que persiste diante dos dias.

alcançou as encruzilhadas.


XXIV
tu me traíste poesia. me deste todas
.....................as ilusões dos sonhos,
.....................................as alegrias,
...................................a esperança.
preencheste os meus vazios com emoções
tantas e não disseste do olhar nos olhos...
escondeste o carinho das mãos a percorrer
.................................................[a face.
por quê não me mostraste, antes, que todos
os versos todos não valem um sorriso?

só depois me disseste que tudo que é
cantado, existe para seguir brisa afora.

tu me traíste poesia!


XXV
gosto de todas as coisas que me apetecem a
alma, mas não queria a alma.
recorrente, brinco sempre com as pétalas de
jasmim. vegetam e me encantam.


XXVI
o que pode fazer com que sintamos mais a vida
do que o desejo de não estar vivo? a agonia é tão
...........................................cheia de vida e dói.
neste quarto, todo branco, onde as velas queimam,
passeiam pelos vãos das portas e janelas o ruído
da rua. o ladrar dos cães misturam-se aos
...................................[tique-taques os relógios.

[o tempo se esvai pela garganta dos cães]

Não tenho outra voz senão a minha voz. escuto-a,
grave e monótona. penso no dia que estarei
..........................................[vazio deste quarto.


XXVII
com os olhos fechados para além o além.
meu rosto relaxa. sinto frio.
o além está dentro de mim.

perdido em mim mesmo.

é necessário a balbúrdia, a correria.
esqueço. é necessário o sono.

não quero estar preso dentro de mim,
há um inferno dentro de mim.
há um mundo imaginário dentro de mim...

tudo é vago, denso e vasto.


XXVIII
disseram-me: "tudo termina com a palavra".
mas a palavra é nada.
assim como as coisas que agora escrevo possuem
o fatídico destino de não serem nada.

desse instante que me consome, nada ficará.
"se eu morresse amanhã", seria apenas uma
lembrança que morreria junto de outras lembranças
e, depois...outras e outras.

[o homem é um uníverso que morre sem que
............................................percebamos.]

é preciso viver fazendo do caminhar importância
maior que o caminho. o caminho é morto. a vida
é morta. é preciso viver dentro da vida como a rosa
.................................[que vive dentro do espinho.


XXIX
entre o néscio e o homem de ação,
apenas uma diferenciação:
um nasceu morto no ontem e, o outro,
espera,
um dia,
nascer no amanhã.


XXX
lá fora a noite está tão antiga. os animais dormem.
......................................................[é o instinto.
não consigo dormir, me falta o instinto, as definições
do homem que poderia ser.

não creio na definição da igreja,
minha racionalidade se perde no meio das ilusões
e a minha sociabilidade aristotélica me confunde.

[se eu fosse um cão saberia os "quês" e os "porquês"
se nao me povoasse os pensamentos abstratos,
........................................seria eu, quase um cão]

esses pensamentos que não me levam a nada,
me fazem vitorioso,
mas essa vitória me põe solitário numa planície
.......................................................[árida...
queria a derrota e estar entre os jardins


XXXI
sou um egoísta.
vivo como um egoísta.só.
um triste deleite.
não pertenço.

um dia, num futuro, terei calma nas tempestades.
os ventos carregarão as folhas,
as árvores mostrarão suas raízes
e, embriagado, nos meios-fios, sentirei
..................................[o abandono sem medo.

não haverá vielas e composições em meus olhos.

(...)

daufen bach.

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