sexta-feira, 28 de maio de 2010

UM SERTANEJO NA CIDADE - MESTRE JOSÉ ACACI

Esse é meu ídolo Acaci, um poeta muito arretado, otimo na rima e no verso, canta e encanta quem o escuta, por onde passa faz sucesso, tudo nele é poesia, inspirado demais esse menino, um artista por demais completo.

UM SERTANEJO NA CIDADE
José Acaci


Não reclamo de nada dessa vida,
acho que tenho tudo que preciso:
Cinco filhos pra esquentar o juízo,
uma filha bem nova e já perdida,
uma sogra mandona, intrometida,
um cunhado pra eu tirar da prisão,
um malandro que me chama de irmão,
dois reais pra pagar minha cachaça,
e um espeto com cheiro de fumaça,
assistindo o Programa do Faustão.

Tenho um bicho de pé meio enfezado,
pra coçar toda noite ao me deitar,
a vizinha que vive a reclamar
do marido que chega embriagado,
tem a outra vizinha do outro lado,
que reclama da vida o dia inteiro,
cada esquina que eu passo é um puteiro,
cada carro é mais um carro de som,
eu já me acostumei e acho bom,
essa minha vidinha de pedreiro.

Aprecio essa tal modernidade...
Já esqueci das virtudes do sertão,
até me acostumei com palavrão...
Isso é coisa comum cá na cidade.
Não preciso falar sempre a verdade,
pois aqui todo mundo é mentiroso,
não preciso ser mais atencioso,
com as pessoas caídas pelo chão,
nem rezar e pedir paz e perdão,
pois meu tempo é um tempo precioso.

Mas não sei o que é que tá faltando,
tenho tudo que eu queria na vida,
mesmo assim tenho em mim uma ferida,
que eu não vejo, mas tá me magoando.
Vez em quando me pego criticando
se aquilo é que é felicidade.
Eu lhe juro que até me deu vontade
de deixar de assistir televisão,
e pedir a Jesus paz e perdão
pelo que eu aprendi cá na cidade.


Por aqui aprendi a dar valor
a assistir filme de pornografia,
a fazer coisas que eu não fazia
quando estava lá no interior.
Dizer não, se alguém pede um favor,
dizer sim, quando a coisa me interessa,
e a viver minha vida numa pressa,
sem ter tempo nem para me coçar.
E agora eu me pego perguntar
se eu queria uma vida como essa.

Já faz tempo que eu vim do meu torrão,
vim pra cá procurando vida boa,
mas aqui não achei uma pessoa
que chegasse pra vir me dar a mão.
Por aqui não é como no sertão,
que a gente trabalha o dia inteiro,
e de noite se senta no terreiro,
sem bandido dizendo “mãos ao alto”.
Não tem bala perdida, nem assalto,
e o vizinho é amigo e companheiro.

Eu queria ter mais tranqüilidade,
e queria ver se arranjava um jeito
de botar mais amor e mais respeito
dentro do peito da sociedade.
Que as pessoas falassem a verdade,
que tivessem amor no coração,
que aprendessem viver sem confusão,
a viver sem mentira e falsidade,
e que o povo vivesse na cidade
como vive o meu povo do sertão.

Eu queria ter uma amizade
como a de João Grilo e de Chicó,
dar bom dia no Bar de Zé Mocó,
ser leal e gostar de lealdade.
Concordar, porém com sinceridade.
Discordar sendo sempre verdadeiro.
Ser marido amante e companheiro,
e servir de exemplo pros meus filhos,
pra viver vendo a vida andar nos trilhos
e morrer tendo Deus como parceiro.


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